2017 – GT06 – Matéria & Memória

Vitória: 25/11, 13h30, Cemuni V, UFES

Projeção cinematográfica, publicidade e mediação religiosa (Richard MacDonald (Goldsmiths, University of London))

Esse artigo apresenta pesquisa e documentação audiovisual da economia ritual da projeção cinematográfica ao ar livre na Tailândia. Fora da rede urbana de multiplexes e estabelecimentos comerciais, existe um circuito alternativo pulsante na região rural do Nordeste do país e nos subúrbios de Bangkok, na forma de grupos de projeção ao ar livre itinerantes, que apresentam filmes em espaços sagrados e comunitários, templos budistas e altares espirituais, como parte da performance de diversas práticas ritualísticas. O artigo descreve os diversos repertórios de apresentação e curadoria que caracterizam esses eventos ao ar livre e discute a multiplicidade dinâmica de fatores que convergem para lhes dar forma: as infraestruturas marginais de distribuição, projeção de imagem e amplificação sonora, sua operação habilidosa, as ideias de eficácia e auspiciosidade que informam a prática do ritual. Os repertórios de apresentação constróem ocasiões públicas ambivalentes. Eles produzem uma aura de publicidade na sua escolha de lugar e na preferência pela maior escala e volume: as amplas telas montadas em andaimes, alta amplificação sonora e imagem de alta resolução. Entretando, a sua principal audiência seriam seres sobrenaturais em vez do público (humano). Sendo assim, esse modo de apresentação cinematográfica coloca em questão nossa noção da projeção como sendo intrinsecamente social, ao canalizar as suas propriedades em prol de práticas de mediação religiosa. Ao contextualizar a projeção cinematográfica como o produto de repertórios sagrados e profanos, esse artigo busca expandir nossa compreensão dos modos contemporâneos e históricos da exibição de filmes, tal como ela aparece na encruzilhada entre diferentes tradições religiosas, culturais e artísticas.

Richard MacDonald is a lecturer in the Department of Media and Communications at Goldsmiths, University of London. He is the author of The Appreciation of Film: The Postwar Film Society Movement and Film Study in Britain (University of Exeter Press, 2015), a study of the diffusion of 16mm projectors, associational life and the making of film culture in Britain. Richard’s research focuses on the circulation of moving images beyond the cinema theatre and on the margins of commodity circuits, an interest pursued in relation to a wide range of social and cultural practice: pedagogic, civic, aesthetic and religious. With a fellowship from the British Academy and ASEASUK Richard is currently researching itinerant film projection and animist ritual practice in Southeast Asia.

 

Questões de acervo e historiografia material do audiovisual (Antonio Laurindo dos Santos Neto (Arquivo Nacional))

O acervo de imagens em movimento do Arquivo Nacional representa um importante patrimônio audiovisual brasileiro. Foi a partir da década de 80 que a instituição começou a se consolidar no tratamento técnico de filmes cinematográficos e registros de canais de televisão. Hoje em dia possui cerca de 60 mil rolos de películas e 5.000 fitas videomagnéticas. Destacam-­se no acervo os cinejornais produzidos pela Agência Nacional, reportagens e programas da TV Tupi, cortes e recortes da censura federal e filmes de ficção e documentários de cineastas como Nelson Pereira dos Santos, Roberto Farias, Vladimir Carvalho, Ivan Cardoso, Lúcia Murat entre muitos outros. O Arquivo Nacional realizou em parceria durante 13 anos o Festival Internacional de Cinema de Arquivo – REcine, que tinha como objetivo a promoção e a conscientização sobre a preservação de acervos audiovisuais públicos e privados.

Em 2015, inaugura um novo evento: Arquivo em Cartaz ­ – festival de cinema dedicado às questões relacionadas aos materiais de arquivo, destacando a (re) utilização das imagens em novas produções e a preservação de acervos. Evento vocacionado para divulgar e incentivar a realização de filmes com imagem de arquivo e para debater e refletir a preservação de acervos cinematográficos. A programação do Arquivo em Cartaz é formada por mostra competitiva de filmes com imagens de arquivo, oficinas técnicas, mesas de debates, exibição de filmes raros, pré­estreias, sessões especiais para o público infanto juvenil, entre outras atrações.

A proposta é apresentar essas duas iniciativas pioneiras voltadas para as questões de acervo desde a preservação até a difusão, destacando maneiras inovadoras de se produzir obras audiovisuais a partir de imagens de arquivo.

Antonio Laurindo dos Santos Neto possui graduação em Arquivologia (2003), especialização em História Moderna (2007) e mestrado em Ciência da Informação (2014) pela Universidade Federal Fluminense. Atualmente é estatutário do Arquivo Nacional, atuando na área de imagens em movimento. É membro fundador da Associação Brasileira de Preservação Audiovisual (ABPA), membro do Grupo de Trabalho de Preservação Audiovisual da Secretaria de Cultura do Estado do Rio de Janeiro, integrante da Câmara Técnica de Documentos Audiovisuais, Iconográficos, Sonoros e Musicais ­ CTDAIS (Conselho Nacional de Arquivos ­ CONARQ) e responsável pela vaga de capacitação da Coordinadora Latinoamericana de Archivos de Imágenes em Movimiento. Curador da 1o edição do Arquivo em Cartaz, festival de cinema dedicado às questões relacionadas aos materiais de arquivo, destacando a (re) utilização das imagens em novas produções e a preservação de acervos.

 

Curadoria, história do cinema, arte moderna brasileira (Adilson Mendes)

A partir da reflexão de Hans Belting sobre a função da instituição museológica na construção da história da arte, esta proposta desenvolve pressupostos sobre a curadoria em cinema (e suas fronteiras) como uma tomada de posição frente a certa historiografia. Tomando então a curadoria como gesto criativo, mas também científico, aqui pensaremos as contribuições de mostras e retrospectivas realizadas pela Cinemateca Brasileira ao longo do século XX e seus impactos nos campos do cinema, mas também no campo das artes visuais, principalmente na formação das primeiras Bienais de São Paulo. A análise do cinema e sua interação com as outras artes é  fundamental para se compreender a reformulação da arte moderna brasileira na passagem da década de 1950 para 1960.

A partir da concentração nas programações realizadas pela Cinemateca Brasileira para as primeiras Bienais, discutir-se-á de que forma o campo das artes plásticas repercute no recém formado campo do cinema e a reflexão sobre uma arte de vanguarda no Brasil no começo da década de 1960. Nesse sentido, a VI Bienal, concebida por Mário Pedrosa, é um caso exemplar na medida em relaciona a arte tradicional com a arte de vanguarda (sobretudo o trabalho de Kurt Schwitters) e tem, na sua programação, uma vasta retrospectiva do cinema soviético, concebida por Paulo Emilio Sales Gomes.

Adilson Mendes é historiador com estudos sobre o cinema brasileiro, especialmente sobre o trabalho de Paulo Emilio Sales Gomes. Curador, foi responsável pela VI Jornada Brasileira de Cinema Silencioso (Cinemateca, 2012), Cine Concertinho (SESC, 2013), Eisenstein / Brasil / 2014 (Museu da Imagem e do Som, 2014) e Eisenstein e as artes (Instituto Moreira Salles, 2014). Doutor em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes (USP), é autor do livro Trajetória de Paulo Emilio (Ateliê Editorial, 2013).