2017 – Painel: Ecologias Infraestruturais

quinta-feira, 01/06, 14h

Artivismo ambiental: intervenção em realidade aumentada na paisagem enferma
Leci Augusto (SEEDF)

Este artigo trata da pesquisa em arte e tecnologia científica aplicada à criação de intervenções artísticas em realidade aumentada em contextos de paisagens enfermas. Paisagens enfermas denotam ambientes que comprometem a qualidade de vida dos seus habitantes como vetores de transmissão de doenças, tais como a dengue e a leptospirose. Partimos da hipótese de que a arte tecnologia voltada para o meio ambiente, em seus processos criativos transversais de sensibilização e diálogo, é capaz de articular diferentes níveis de percepção da realidade, promovendo processos de conscientização do lugar. Construímos estratégias que privilegiam a experimentação de uma prática artística contemporânea, tecnológica, interativa, e que também respaldam a reflexão de cunho ambientalista e evidenciam a sensibilização e ativação dos indivíduos em prol de suas comunidades. A discussão teórica proposta parte de um projeto artístico em realidade aumentada. Com o uso dessas tecnologias, a paisagem que é permanentemente moldada pelas práticas sociais em toda a sua diversidade faz com que novos padrões para a existência humana sejam (re)descobertos, (re)apropriados e (re)incorporados.

Leci Augusto é doutora em arte e tecnologia pelo Instituto de Arte da Universidade de Brasília. Sua pesquisa tem como base a investigação teórico-prática, resultante do desdobramento de estudos sobre paisagem no campo da arte e tecnologia, abordando o meio ambiente sob perspectivas transdisciplinares. É professora da Secretaria de Estado de Educação do distrito Federal. Como artista, trabalha com a questão ambiental na forma de instalações (environment art) e gameart. Realizou um projeto colaborativo de criação: um game para crianças de combate à dengue.

 

O pixel aparente: realismo, cinema e informação
José Cláudio S. Castanheira (UFSC)

Dispositivos tecnológicos – analógicos ou digitais – de alta ou de baixa definição trazem impressos em si novas formas de ver e ouvir. As oscilações entre padronização e singularização, entre controle e criatividade, entre corporificação e virtualização, entre hardware e software apresentam-se como questões ainda não resolvidas na atual cultura digital. É como se os mecanismos fisiológicos e psicológicos colocados em ação no ato de ver um filme – repertório cultivado a partir de investigações científicas do século XIX e de modelos surgidos com o estabelecimento de um sistema de produção em massa, no século XX – necessitassem de uma revisão. Desvios não intencionais na compreensão de novos processos técnicos podem levar a uma readaptação, também não prevista, do espectador. Tecnologias imersivas são, de modo geral, relacionadas a uma ideia bastante cambiante de reprodução do “real”. Essa reprodução se vale, na verdade, de uma subjugação dos processos perceptivos e de um apelo ao excesso de estímulos produzidos pelo dispositivo. A noção de “real” em pequenas telas; em tempos de fluxos informacionais fragmentados; ou a partir de serviços instáveis de streaming é ampliada e desestabilizada. A proposta deste trabalho é a de repensar conceitos desde sempre presentes em tecnologias audiovisuais tais como “fidelidade”, “realismo”, “imersão”, etc. e realocá-los em um universo mais contemporâneo na produção de imagens e sons.

José Cláudio S. Castanheira é doutor em comunicação pela Universidade Federal Fluminense. É professor e coordenador do curso de Cinema da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Pesquisador nas áreas de música, estudos do som e cinema. É um dos colaboradores no livro Reverberations: The Philosophy, Aesthetics and Politics of Noise (2012), editado por M. Goddard, B. Halligan e P. Hegarty; no livro Small Cinemas in Global Markets: Genres, Identities, Narratives (2015), editado por L. Giukin, J. Falkowska e D. Nasser; e no livro Music/Video: Histories, Aesthetics, Media, editado por G. Arnold, D. Cookney, K. Fairclough e M. Goddard (2017).

 

Internet Landscapes, de Evan Roth: infraestrutura e espacialidade da imagem-rede
André Mintz (UFMG)

Na sua recente série de trabalhos intitulada Internet Landscapes (2016-), o artista estadunidense Evan Roth apresenta vídeos registrados onde cabos submarinos da Internet chegam ao continente na costa da Austrália, Reino Unido, Suécia e França. Os vídeos são exibidos online, com seus arquivos hospedados em servidores daquelas localidades, de modo que seu acesso, inevitavelmente, ativa a infraestrutura retratada – o que pode ser percebido através de ferramentas de rastreamento da rota dos pacotes de dados trocados entre o computador do espectador e os servidores que hospedam o trabalho. Esta comunicação propõe abordar essa obra a partir de aspectos da teoria ator-rede, elaborando tentativamente a noção de imagem-rede, na articulação das relações da obra com suas infraestruturas de armazenamento e distribuição. Trata-se de proposição que pode ter múltiplas implicações considerando-se a arte e seus processos de produção, circulação e significação, mas que nesta comunicação terá como principal enfoque a maneira com que a obra de Roth põe em destaque suas dependências com a infraestrutura da Internet e as características particulares da espacialidade assim constituída. Nesse sentido, as “paisagens da Internet” elaboradas por Roth serão contrapostas às promessas do ciberespaço, em uma reconsideração das relações entre a Internet e seu imaginário.

André Mintz é artista e pesquisador da imagem e mídias digitais. Mestre e doutorando em Comunicação Social pela UFMG, com bolsa concedida pela Capes.  Atualmente finaliza também mestrado em Media Arts Cultures (Donau University, Aalborg University e Lodz University). Foi professor de mídias digitais nos cursos técnicos da Oi Kabum! Escola de Arte e Tecnologia, de Belo Horizonte e também fundador e membro do coletivo Marginalia Project e do Marginalia+Lab.

 

Metadados apropriados pela arte
Bruno Zorzal

Mais do que nunca, os dados técnicos se fazem presentes e, talvez pela primeira vez na história, alcançam os espaços e tempos não somente públicos e concretos, mas também esses íntimos e subjetivos dos indivíduos. E o problema evolui e se complexifica visto que, com o advento do digital, à dimensão dos dados incorpora-se aquela dos metadados.  Assim, como pensar a apropriação, o détournement, a “piratagem” quando o objeto da ação não são somente os dados, mas também os metadados? Explorados por empresas, visados por hackers, esses elementos que entram na constituição de nossas realidades, virtuais ou não, e permitem a padronização de dados a nível planetário são procurados também por artistas. Assim, de que maneira esse contexto renovaria a noção de apropriação e uso de criações humanas? Refletindo a partir de práticas com vocações artísticas tendo por objeto os metadados, colocaremos em perspectiva a própria noção de metadados, suas definições, seus alcances, bem como as relação que estabelecemos com essas metainformações que podem ser, ao mesmo tempo, instrumentos de poder e objetos para a produção subjetiva.

Bruno Zorzal é artista e teórico da fotografia, membro de RETINA Internacional e pesquisador associado do laboratório Art des images & art contemporain (Labo AIAC), Universidade Paris 8, na França. Publicou Les photos, un matériau pour la photographie e Exploitation photographique de photos déjà existantes (Paris, L’Harmattan, 2017). Expõe, desde 2007, no Brasil e no exterior.